Após o GP de Assen e aproveitando a pausa de Verão no campeonato, Miguel Oliveira juntou a imprensa nacional para uma conferência de imprensa e almoço, onde estiveram também três dos jovens pilotos da sua equipa, os dois Afonso Almeida e também Francisco Pires. O ambiente foi sempre descontraído e Oliveira mostrou-se muito confiante e assertivo nas suas palavras, parecendo mais motivado que nunca para a segunda fase do campeonato.
Na revista Motos que foi hoje para as bancas temos um pequeno resumo do que foi falado, mas aqui podem ficar com todos os temas que foram debatidos com o representante nacional no MotoGP.
“Toda a época tem sido bastante competitiva, temos ido a vários circuitos e temos batido vários recordes. Cada vez mais os terceiros treinos que dão acesso direto à Q2 estão a virar autênticas sessões de qualificação em que se batem recordes, e portanto torna-se cada vez mais difícil estar naquele grupo tão restrito dos 10 primeiros. As motos têm evoluído bastante, e a proximidade técnica entre vários construtores tem contribuído massivamente para que as coisas estejam muito mais apertadas e que o espetáculo seja muito bonito. As corridas têm sido espetaculares, com várias ultrapassagens, com muita incerteza naquilo que será o resultado final. Temos visto surpresas, mas está a ser um campeonato muito interessante e acho que vários fatores contribuíram para isso. O facto de no último ano também não termos tido um desenvolvimento de peças para as motos veio aproximar tudo um pouco, e estamos a ver que todos os pilotos conseguem explorar ao máximo as suas máquinas e que isso acaba por trazer uma proximidade competitiva total.”
Como foi a experiência da vacinação em todo o paddock? Muita gente foi afetada, como é que isso funcionou contigo?
“A minha experiência pessoal foi diferente, e no paddock tivemos testemunhos muito variados de pessoas que sentiram qualquer coisa ou não sentiram nada. Mas foi um ponto de viragem, para podermos dar continuidade ao nosso campeonato que tem uma caravana gigante de pessoas, equipas e pilotos. Foi importante a Dorna garantir isso no Qatar, e o certo é que temos visto praticamente zero casos no paddock e estamos a viajar pela Europa inteira. Eu tive ligeiro sintomas de febre até quinta-feira antes da segunda corrida, mas felizmente toda a equipa passou bem e de boa saúde durante o fim-de-semana.”
Um início de época em que as coisas não começaram por correr da melhor forma, mas depois tudo mudou…
“É um tema em que parece que escondo sempre alguma coisa, mas não há nada a esconder. Nós em Mugello começámos a usar um chassis que já tínhamos testado no passado após o GP de Jerez. Achámos que em longa duração, numa corrida, era um chassis que podia trazer algo positivo e em Mugello pudemos ter essa confirmação. Por outro lado, a equipa aliou-se a um novo parceiro técnico de combustível, e tudo junto acabou por dar um bom resultado. Da minha perspetiva de quem trabalha desde sempre na boxe, já vínhamos com a sensação que um pódio já podia ter chegado há mais tempo, talvez logo na 2º corrida no Qatar onde tivemos o problema eletrónico. Em Portimão também poderia ter terminado no pódio e em Jerez foi mais complicado pela minha posição de saída mas o ritmo também não era promissor. Em França as coisas podiam ter corrido bem mas caí na corrida. E assim parece que as coisas só começaram a correr bem em Mugello, mas da minha perspetiva já tínhamos tudo para que as coisas corressem bem mais cedo, mas a competição é mesmo assim, e a pontinha de sorte que eu não gosto muito de usar mas que existe, também faz a diferença.”
Em relação à pergunta se o próprio Miguel também mudou alguma coisa na sua preparação, ao longo do fim-de-semana,
“Julgo que o mau arranque de campeonato me deu alguma ansiedade em querer mostrar alguma coisa, pois até Mugello os resultados não foram de facto bons. Isto apesar de toda a gente saber do meu valor, mas um bom resultado era necessário na equipa, e a partir daí tudo começou a entrar em piloto automático, e as corridas seguintes foram diferentes.”
Quanto ao seu futuro, Oliveira respondeu de forma curiosa.
“O mercado e os contratos nos tempos modernos vêm demonstrar que, e existem alguns casos assim, quando não existe vontade de uma das partes, seja do piloto ou da equipa, os contratos são quebrados. Hoje em dia ter um contrato assinado vale o que vale, como se costuma dizer. Eu tenho um compromisso assumido com a minha equipa, já desde o ano passado, e essa é uma palavra que eu não vou voltar atrás. Naturalmente que esta situação do Viñales veio trazer algum nervosismo às negociações e veio antecipar um bocadinho as negociações para o futuro. Também fui abordado nesse sentido, mas tal como disse há pouco, o meu foco está na minha equipa, uma grande equipa com a qual acredito que posso ser campeão do mundo. Até o conquistar haverá certamente muito trabalho a fazer.”
Quanto aos pontos fortes da sua moto e aos aspetos menos bons da KTM face à concorrência…
“em primeiro lugar, temos de partir da premissa que hoje em dia nenhuma moto é má, e todas as motos que alinham na grelha do MotoGP são muito competitivas. Das 22 motos que alinham na grelha, temos 20 oficiais, as outras são do ano 2019/2020, portanto com esse suporte técnico e igualdade entre construtores, é difícil perceber quais são os nossos pontos mais fortes e os menos bons. O que queremos melhorar para o futuro, e mantendo as características que temos de parar bem a moto na curva, e de quando existe menos grip na pista de podermos utilizar bem a eletrónica e utilizar bem as características do nosso motor V4, aquilo que gostaríamos era de poder ganhar alguma agilidade quando temos muito peso na frente da moto, como aconteceu agora em Assen, onde as motos com motores de 4 cilindros em linha são muito mais naturais nas mudanças de direção e mais rápidas. No Qatar também, onde sofremos muito nas mudanças de direção a travar, é o ponto onde temos de nos focar neste momento. Em Assen já fomos a segunda moto na corrida com motor V4 atrás da Ducati, e é isso que tentamos ter como base e visão futura para construir a nossa moto do ano que vem. Não é fácil porque neste momento o compromisso de não estragar algo que já esteja bom tem que ser tido em conta, mas tudo o resto são pequenos detalhes que vamos sempre otimizando, seja a estratégia de eletrónica, mapas de injeção e corpo de injeção, a forma como otimizamos todo o ar que entra pela moto, e algo que ainda existe por explorar mais e que tem sofrido um elevado investimento que é a aerodinâmica. Aqui também ainda existe algum trabalho a fazer.”
Em relação às dificuldades no início de época, “nós tivemos a dificuldade no início do ano que foi a adaptação a um novo pneu assimétrico da Michelin. A nossa moto tem uma baliza de temperatura de pista muito pequena para os compostos dos pneus dianteiros, para estes poderem trabalhar, e por isso a adaptação foi técnica, o repensar um pouco como poderíamos transferir mais o peso para a parte dianteira da moto, gerando calor suficiente para que o pneu funcionasse. Também temos tido sorte nas últimas corridas, pois os compostos não são assimétricos e temos bastante à vontade para poder trabalhar com esses compostos. Neste momento no MotoGP, os pneus são dos componentes mais importantes que precisamos de acertar logo, e é muito difícil arranjar uma linha de equilíbrio para podermos trabalhar com todos os compostos que temos da Michelin. Não é assim tão linear como ter um macio, um médio e um duro como vemos na televisão, não quer dizer que sejam assim, e é difícil passar essa mensagem cá para fora. A Michelin é um parceiro excelente e não falhado a nível de segurança, e nós temos que avaliar durante todo o fim-de-semana os diversos parâmetros para que as coisas funcionem da melhor forma. Portanto houve uma adaptação técnica, e da minha parte consegui em algumas corridas, como na de Barcelona, arriscar um pouco mais pois consegui perceber até onde poderia levar a minha moto. E isso dá-me alguma vantagem face aos outros pilotos KTM que em certas alturas não compreenderam tão bem os pneus.”
Sendo questionado acerca do atual panorama de quase “caos” nas corridas de Moto3, e o que poderia ser feito para minimizar isso e aumentar a segurança,
“creio que a realidade dura é que o nível atual não é muito elevado como no passado em que houve vários pilotos a destacarem-se nas corridas. É fácil levar uma Moto3 ao limite, em que os cones de ar são super importantes e dão uma grande vantagem; mas para aumentar um pouco o nível da categoria talvez se devesse aumentar a potência das motos ou alterar por exemplo a largura dos pneus, aumentando assim a dificuldade técnica de levar a moto ao limite, e assim o piloto poderia sobressair um pouco mais em corrida. E assim os pilotos poderiam andar um pouco mais separados. É uma das opções.
O Fabio Quartararo está em primeiro, destacado no campeonato. Acreditas que ele pode quebrar até ao final do campeonato e que podes lutar pelo título? «O Fabio é um piloto super forte, numa forma incrível. Acredito que nós conseguimos batalhar com ele e com outros pilotos. Em relação a metas ou expetativas é sempre a resposta do costume, nós apontamos sempre para o melhor. Acreditamos em nós e no nosso trabalho e depois temos de concretizar o resultado que faça jus àquilo que somos capazes de fazer. Mas não corremos sozinhos, temos adversários, circunstâncias e fatores externos que podem influenciar o resultado, portanto a nossa função é focar-nos naquilo que conseguimos controlar, dar o melhor em pista e enquanto equipa com conseguirmos analisar bem e fazer o nosso trabalho.”
Quais os circuitos onde estarás mais à vontade e menos à vontade nesta segunda parte do campeonato?
“Diria que os circuitos onde estaremos menos à vontade serão aqueles onde não competimos com a nossa moto de versão 2020, que é basicamente aquela que usamos atualmente. Portanto pistas como o Texas ou a Tailândia, pelo desconhecimento, pela falta de experiência com esta moto. Mas acredito que também haja circuitos que sejam mais amigáveis para esta moto e para o meu estilo de condução.”
Quantos anos achas que vamos ter de esperar até termos mais um piloto no campeonato do mundo de velocidade?
“Não sei, mas sei que há imenso potencial. Nesta mesa estão três jovens e ainda faltam mais dois pilotos da nossa estrutura com muito potencial. O investimento da nossa parte é alargar um pouco a formação para podermos passar algum conhecimento técnico, os tempos também são muito diferentes de quando me iniciei, e o que mais importa é passar o máximo de conhecimentos que fomos ganhando ao longo dos anos. Uma coisa é certa, por muito que os ajudem, terão de ser eles próprios a querer. Há alguns que querem muito mas não têm ajuda e não conseguem. Os que têm ajuda têm de querer muito para poder agarrar as oportunidades que surgem, é talvez a mensagem que aqui deixo.”