O demónio da Baviera
BMW M 1000 R. Quando a BMW lançou a S1000R, em 2014, seguiu a moda de adaptar a desportiva de topo RR a uma utilização menos radical, modificando o comportamento ciclístico e ‘amaciando’ o motor. Três anos depois foi ligeiramente retocada, mas esse estado de espírito foi agora ‘revisto em alta’ na M1000R. Afastem-se!
Na BMW as designações são muito mais que um código. Da histórica série R à distinta família K, passando pelas F, G, C e HP, todas elas ocupam um espaço único no nosso imaginário. A mais recente linhagem adota a designação M, e a escolha não é leviana. Significa que nasceu no departamento Motorsport!
Berço de eleição para a M1000R, que a BMW decidiu batizar de Hyper Roadster e que, em português pode ser traduzido como um ‘pedaço de mau caminho’! É que é impossível olhar para ela e não surgirem de imediato ideias reprováveis, envolvendo vontades inconfessáveis. Imponente e simultaneamente elegante, recheada de detalhes técnicos destinados a serem apreciados por quem sabe aquilo que tem, dá nas vistas pelas asas que lhe foram adicionadas. Mas o mais importante está (pouco) escondido. Afinal o alucinante quatro cilindros em linha que partilha com a S1000RR, dotado de ShiftCam e com 210 cv de potência está à vista.
Bloco que, graças ao encurtamento das 4ª, 5ª e 6ª velocidades e à soma de dois dentes à relação final, gasta apenas 7,5 segundos a chegar aos 200 km/h e, pulveriza todos os valores da S1000R. A título de exemplo, dos 140 aos 180 km/h demora apenas 2,8 s, contra os 4 s da antecessora, ou seja, 42% a menos!
O demónio e os anjos da guarda
Verdadeiro demónio que conta com o apoio de ‘anjos’ como os quatro modos de condução destinados à estrada, Rain, Road, Dynamic e Race, a que a BMW juntou mais três Race Pro para explorar todo o enorme potencial em pista. Configurações que ‘mexem’ com a última geração do sistema de controlo de tração e com o sistema Wheelie Control, sendo o acelerador e o travão motor ajustáveis em três níveis de resposta. Para terminar, o Brake Slide Assist, útil e efetivo quando estamos com disposição para o ‘drift’, o Shift Assistant Pro para trocar de caixa sem embraiagem e o Hill Start Control para facilitar o arranque nas subidas. Para a eventualidade, num futuro próximo, de quererem participar no troféu M1000R Cup, podem contar com o Launch Control, para arranques canhão, e o Pit Lane Limiter, para não serem repreendidos pelo diretor de prova.
Com diferentes exigências em termos de ciclística face à base desportiva, a M1000R responde a uma utilização mais abrangente com ajustes diferentes no quadro e nas suspensões. A altura do assento ao solo é mais elevada 16 mm, o ângulo da coluna de direção é de 24º e a distância entre eixos ligeiramente mais curta, enquanto o amortecimento é completamente ajustável. Mas a performance também se mede na desaceleração e não é de estranhar que as pinças montadas radialmente tenham o acabamento anodizado azul das versões mais desportivas da marca, surgindo uma bomba radial na dianteira.
Avalanche de sensações
Após cerca de 200 quilómetros em vários cenários, de urbanos a montanhosos, de troços estreitos ladeados por muros a longas retas sem vigilância da ‘brigada’ e um ‘bónus’ de cinco voltas à pista de Almeria, ficámos com a real dimensão do que esta BMW M 1000 R tem para oferecer. A primeira impressão que sobressai é de leveza, surpreendendo pela facilidade de movimentos laterais. Os 840 mm de altura do assento são também atenuados pela sua reduzida largura frontal, permitindo tocar com os pés no chão a quem tem apenas 1,70 m de estatura. O guiador é largo (84 cm) e abrimos os braços à contemplação do enorme ecrã TFT, elegante, completo, e cujo acabamento sem brilho oferece uma excelente leitura.
Posição que permite um controlo fácil, numa descoberta gradual em função das situações que vão surgindo, absorvendo bem as lombas citadinas, entrando suavemente nas rotundas, revelando um acionamento acetinado do Power Shift e com as pinças M a transpirar progressividade. Em sexta velocidade conseguimos baixar até aos 45 km/h, por volta das 2.000 rpm, sem que o motor proteste.
Mas, quando já duvidávamos do que nos havia sido anunciado, entramos na primeira estrada montanhosa e a fera despertou. Começamos a ‘apertar’ com a ciclística, ao meter a frente ainda em travagem, a rodar o punho ainda em ângulo e a jogar com o seletor de velocidades, não por necessidade, mas pelo prazer de ouvir o estalido provocado. O sorriso de felicidade transformou-se subitamente em vergonha angustiada. Num intervalo desta emoção, ao olhar com mais atenção para o painel percebo que ainda não tinha passado sequer das 6.000 rpm! Afinal, ‘aquilo’ ainda não era nada. O que não era propriamente tranquilizador!
De volta à escola…
Começamos então a perceber realmente o que temos nas mãos, como reage e de que forma o conseguimos gerir. Começando pela parte mais fácil, rapidamente percebemos que a entrada em curva e a travagem são suficientemente previsíveis. Em momento algum nos arrependemos do atrevimento até ao patamar que a nossa experiência e o sentido de auto preservação aconselhava. Tornava-se evidente que em redor de tudo aquilo há ‘mão eletrónica’, mas é de tal forma dissimulada que nos parece natural. Já no que diz respeito à disponibilidade do motor somos confrontados cruamente com a realidade. Ele está lá e diz ao que vai se assim o quisermos, ficando à nossa discrição provocar o diabo. Nunca senti nada semelhante, ou sequer próximo, numa moto que tivesse como condição poder levar uma matrícula na traseira. Só em zonas amplas e livres de obstáculos é que o ‘derreti’, e nem mesmo o facto de sentir a eficácia das várias intervenções na direção e elevação da roda dianteira atenuou a emoção ao fazê-lo. O simples movimento de trocar de caixa, no meio daquela explosão de aceleração, nunca coincidiu com o momento certo, e era sempre com o alívio de quem sobrevive a um momento de aperto que dava por terminado o exercício.
CONCLUSÃO
E foi assim ao longo de mais de 200 quilómetros! Quando parei, com um sorriso rasgado, formou-se uma imagem na minha mente. Os sorrisos divertidos dos técnicos do departamento Motosport da BMW que, orgulhosos pela ‘obra feita’, vão trocando olhares gozões como que a dizer: “Era isto que queriam? Está aqui, agora aguentem-se”. Uma coisa é certa, aos comandos da BMW M1000R o Mundo ganha novas cores. Cabe a cada um a coragem de despertar o demónio.
FICHA TÉCNICA – BMW M 1000 R
Motor Quatro cilindros em linha, refrigeração líquida, DOHC com sistema BMW ShiftCam, 16 válvulas
Cilindrada 999 cc
Alimentação Injeção eletrónica BMS-O , acelerador eletrónico
Potência 210 cv/13.750 rpm
Binário 113 Nm/11.000 rpm
Transmissão Caixa de seis velocidades. Final por corrente
Quadro Dupla trave em alumínio
Suspensão dianteira Forquilha telescópica invertida, diâmetro 45 mm, curso de 120 mm
Suspensão traseira Monoamortecedor, curso de 117 mm
Travão dianteiro Dois discos de 320 mm, pinças radiais de 4 pistões. BMW ABS Pro (desconectável)
Travão traseiro Disco de 220 mm, pinça de pistão simples
Pneu dianteiro 120/70 x 17”
Pneu traseiro 190/55 x 17”
Dist. entre eixos 1450 mm (regulável)
Altura do assento 840 mm
Peso 199 kg (em ordem de marcha)
Depósito 16,5 L.
Consumo (anunciado) 6,4 L/100 km
Cores Branco/M Motorsport e Preto Storm metalizado/M Motorsport
Garantia 3 anos sem limite de km
Importador BMW Motorrad Portugal
PVP 29.323 €
Por: ALBERTO PIRES/MOTOX.PT •
Fotos: BMW