Honda NT 1100: A moda, essa infame ditadora das leis de mercado, criou necessidades inexistentes nos motociclistas. E vendeu sonhos a bom preço ou mesmo a crédito. Desejos de evasão e grande aventuras. Infindáveis travessias intercontinentais, enfrentando todo o tipo de condições em longas jornadas das rápidas autobahn alemãs às piores estradas siberianas. Dos estradões alentejanos às finas areias da Mauritânia…
POR PAULO RIBEIRO
FOTOS PAULO CALISTO
Entretanto toca o despertador e apercebemo-nos de que, na realidade, aquela que vivemos acordados, até ao continente africano vamos uma ou duas vezes na vida. E à Sibéria… bom, aí faz muito frio. Na incontornável objetividade do dia a dia, perguntamos se faz grande sentido utilizar uma maxi-trail de grande altura ao solo, com potência para lá dos 150 CV e bem mais de 200 quilos de peso. Mas logo vem a paixão (e a moda!…) azucrinar a cabeça, insinuando-se de forma quase demoníaca conduzindo à decisão porventura menos pragmática. Mas muito mais colorida, é certo.
Vem este introito a propósito de uma realidade que tenderá a reverter-se nos próximos anos. Não, as maxi-trail não vai sair de cena, mas, muito certamente, vão ser remetidas para um lugar que é o seu por direito. São viajantes incansáveis, é certo, e a imagem aventureira é cativante. Mas será que são as máquinas mais lógicas para quem quer, apenas, passear de forma simples e tranquila, e usufruir da vantagem da mobilidade e rapidez em deslocações urbanas?
A questão, assaz pertinente, remete-nos para a história. Da Honda como de outras marcas. No caso da marca nipónica, criada por Soichiro Honda, recordemos a estreia desta mesma sigla NT (de New Touring), em 1988, com a NT600 Revere, equipada com o motor da XL600V Transalp. Abordagem pensada, tal como agora, para quem procura eficácia e economia, performances e fiabilidade, conforto e facilidade, dimensões compactas com o máximo de capacidade de transporte. Proposta tão eficaz no lufa-lufa quotidiano como nas mais longas viagens transcontinentais. Da facilidade de apoio dos pés no solo nas constantes paragens em cidade, à estabilidade inquestionável em autoestrada passando pela grande agilidade, nas mais recurvadas estradas de montanha, sempre com uma posição de condução intuitiva e confortável.
Eficácia e discrição
Voltemos à História para perceber que, tal como a NT600 derivou de uma trail, também a NT1100 foi desenvolvida a partir da Africa Twin, sem que isso aportasse uma estética tipo SUV. Antes vincando uma filosofia assumidamente turística, juntando linhas esguias e formas compactas, em imagem elegante, de grande sobriedade. Design diferenciado, claramente inspirado na X-Adv 750, com iluminação dianteira que parece ser assinatura exclusiva da nova linha turística da marca da asa dourada.
Trabalho do departamento de design que ganha outra dimensão ao juntarmos a vertente ergonómica, com oferta, desde o primeiro momento, de sensação de grande familiaridade, como se aquela moto como fosse a nossa desde sempre. Muito fácil de montar e com altura ao solo que permite fácil colocação dos pés a todos os condutores com um metro e setenta, o banco mais estreito na parte dianteira, mas com ampla superfície para trás e bom apoio lombar, garante encaixe perfeito das pernas no depósito colocando o condutor bem dentro da NT. Posição de condução bem encaixada e com as costas bastante direitas, oportunidade para validar uma proteção aerodinâmica surpreendentemente fabulosa, sobretudo ao considerar a frente razoavelmente esguia e um ecrã de dimensões comedidas. Em autoestrada, com o ecrã na posição mais alta das cinco possíveis, a proteção é tão eficaz que é possível circular no limite de velocidade (e até um bocadinho mais…) com o capacete modular em posição aberta sem sentir qualquer pressão acrescida na cabeça. Nem sequer na parte posterior dos ombros graças à passagem de ar inferior no ecrã que desvia a pressão bem para trás do condutor. Excelente é também a proteção para as mãos e pés, com os defletores montados de origem a evitarem o incómodo do frio nas mãos (embora os superiores apresentam algumas vibrações que deixam no ar a dúvida da resistência com o passar do tempo) e dos pés. Para os mais friorentos, os punhos oferecem, de série, cinco níveis de aquecimento, com uma potência máxima que deverá ser utilizada apenas na viagem para a invernal Concentração dos Pinguins.
Turismo… em cidade
Mas a NT1100 é proposta capaz de cumprir as necessidades de quem não para de viajar pelo País e estrangeiro, mas com muitas incursões nas grandes cidades. As malas laterais, montadas de série, são razoavelmente estreitas (apenas mais 3 centímetros para cada lado face ao guiador), sem que tal represente menor capacidade de carga. São 65 litros no total, a que se pode juntar, em opção, top-case de 50 litros, com espaço para dois capacetes integrais. Que não cabem nas laterais.
Espaço importante nas grandes viagens como nas pequenas voltas com passageiro que, em termos de conforto, vai ainda mais bem servido do que o condutor. Se este tem uma excelente posição de condução, com boa proteção aerodinâmica e um banco confortável, a companhia tem, de série, um banco com 60 mm de espessura de espuma, oferecendo ainda amplas pegas para as mãos e bom espaço para as pernas. O que pode ainda ser melhorado com os packs Comfort ou Tourer, contemplando banco ainda mais confortável (mais 15 mm de espessura e material mais macio), poisa-pés mais largos e com cobertura de borracha e encosto para as costas na mala.
Para o condutor será mais relevante a facilidade de colocação em curva e grande precisão, juntando a bem conhecida compostura da Africa Twin às rodas de 17 polegadas em alumínio fundido em moldes de areia para maior leveza. Garantia de grande precisão de trajetória e muita facilidade nas mudanças de direção. Um verdadeiro regalo! Tal como os travões com potência q.b. numa dianteira que brilha, sobretudo, pela progressividade. Talvez em demasia para quem quiser adotar um ritmo mais desportivo do que a filosofia realmente turística aconselha.
Conforto a toda a prova
Ritmo acompanhado a rigor pelas suspensões, oriundas da Showa, com forqueta invertida tipo Big Piston Fork, de 43 mm de diâmetro, oferecedora de um feeling muito direto da estrada e elevada capacidade de leitura do asfalto. E a nível de conforto, mesmo sem utilizar a possibilidade de regulação em pré-carga (20 posições), mostrou-se em muito bom patamar.
O mesmo na traseira onde o monoamortecedor permite fácil ajuste da pré-carga do sistema hidráulico (30 posições) através de um manípulo de fácil acesso. E, aqui sim, faz sentido mexer neste controlo remoto para melhor adaptação às condições de carga.
Amortecimento que é diferença maior na ciclística da NT face à AT, com um quadro que difere apenas em meia dúzia de pontos de fixação, o mesmo sucedendo com o bem conhecido motor, garantia de eficácia, fiabilidade e diversão. Motor de carácter do motor ajustado às novas vivências, trabalhado para a maior suavidade e facilidade que se pede a uma turística de eleição, com entrega de potência de forma diferente. As mudanças na injeção eletrónica, na admissão (caixa de filtro de ar e condutas de entrada de ar redimensionadas) e no escape (interior redesenhado) garantem maior suavidade nas acelerações. E a ausência da válvula de escape faz desaparecer aquele ‘boost’ que se sentia por voltas das 5000 rpm na Africa Twin e que causava agradável descarga de adrenalina.
Inalterada ficou a recheada dotação eletrónica com 3 modos de condução pré-definidos a que se juntam mais dois personalizáveis. E se o Rain garante enorme suavidade mas menor potência disponível, pensando em maior segurança face aos pisos escorregadios, o Urban é patamar intermédio para utilização citadina e tranquila. Já o Road é, sem dúvida, o mais divertido, permitindo ritmo deveras agradável, rápido sem ser cansativo. E, juntando o nível S3 do DCT, o mais ‘desportivo’, proporciona momentos de grande diversão, com acelerações fortes e muito lineares, comprovando que é uma verdadeira turística. Mas que, pelo equilíbrio dinâmico e potencial do motor, permite andar depressa e bem.
Ainda acha que precisa de uma maxi-trail de 25 mil euros para fazer viagens em grande conforto e segurança?
FICHA TÉCNICA HONDA NT1100
Motor 2 cilindros paralelos, SOHC, 4 válvulas, refrigeração líquida
Cilindrada 1084 cc
Potência 101 cv às 7500 rpm
Binário 104 Nm às 6250 rpm
Caixa de velocidades DCT – caixa de dupla embraiagem de seis velocidades
Velocidade máxima n.d.
Quadro Berço semi-duplo
Suspensão dianteira Forquilha invertida Showa tipo SFF-BP, ø 43 mm, curso 150 mm. Ajustável em pré-carga
Suspensão traseira Mono amortecedor Showa, ajustável em pré-carga
Travão dianteiro Dois discos de 310 mm com pinças radiais de 4 êmbolos
Travão traseiro Disco de 256 mm com pinça de êmbolo simples
Pneu dianteiro 120/70-17”
Pneu traseiro 180/55-17”
Distância entre eixos 1535 mm
Altura assento 820 mm
Peso 248 kg (238 kg MT)
Depósito 20,4 L
Cores Cinzento, preto ou branco
Garantia 3 anos
Importador Honda Motor Europe, Portugal
Preço 15 100€ (14 100€ transmissão manual)