No passado sábado, dia 17 de maio, a associação sem fins lucrativos No Barriers ODV inaugurou o uso da sua primeira moto elétrica de motocross – a Nicot – na Fondazione Don Gnocchi, em Salice Terme.
Foi um evento simbólico e prático: não só marcou a estreia do novo veículo, mas também representou um novo marco na jornada iniciada em 2020 – uma jornada muitas vezes mal compreendida pelo público: a terapia motorizada.

A terapia motorizada ainda é descrita por alguns como uma atividade meramente recreativa ou espetacular, sem valor terapêutico. Trata-se de um julgamento superficial, que ignora anos de experiência documentada e, acima de tudo, evidências recolhidas no terreno por educadores, terapeutas, fisioterapeutas, neurologistas e psicólogos clínicos que testemunham os seus efeitos nos pacientes todos os dias.
“Não são os especialistas dos programas de televisão que determinam a eficácia do que fazemos. São os pediatras que nos convidam a voltar e os profissionais que trabalham diariamente com pessoas com deficiência e vêem os benefícios em primeira mão. São eles que nos ligam, pedindo-nos para voltar, tornando estes dias parte dos seus programas terapêuticos”, afirma Ernest Pozzali, presidente da No Barriers ODV.
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Para quem trabalha de perto com crianças e adultos com deficiência – sejam profissionais de saúde, educadores, famílias ou cuidadores – não são necessários artigos académicos para reconhecer o profundo impacto destas experiências. Basta ver uma criança autista subir numa motocicleta pela primeira vez, olhar para a frente, segurar-se com força e rir. A terapia motora estimula a presença, a confiança, a orientação corporal e a conexão.
Não é entretenimento – é uma experiência transformadora. As críticas geralmente vêm de pessoas que nunca assistiram a uma sessão de terapia, nem acompanharam uma pessoa com deficiência num contexto de terapia motora guiada. Às vezes, até mesmo de familiares que, nunca tendo observado a prática de perto, associam a palavra «terapia» exclusivamente a tratamento clínico ou farmacológico. Esta é uma visão limitada.

A Organização Mundial da Saúde define terapia como qualquer tratamento médico destinado a curar um distúrbio ou doença, incluindo intervenções educacionais, relacionais e comportamentais. A educação terapêutica, em particular, ajuda os pacientes e suas famílias a compreender, gerir e melhorar ativamente as suas condições de saúde. Dentro deste quadro, a terapia motora qualifica-se plenamente como uma Terapia Não Farmacológica (NPT) – uma prática complementar, não uma alternativa aos caminhos clínicos tradicionais.
Uma resposta mensurável e moderna à necessidade de cuidados humanizados e inclusivos. Benefícios clínicos da terapia motora:
Sensorial: estimulação da audição, do tato, da visão e do olfato, reativando conexões neurais Emocional: envolvimento afetivo, regulação do humor, ativação do sistema límbico
Cognitivo: memória autobiográfica, orientação temporal, auto-narração
Relacionais: interação ativa com a equipa, os pacientes e o contexto, reduzindo o isolamento Motivacionais: aumento do sentido de agência, confiança e autonomia
Neuroquímicos: libertação de dopamina, serotonina e adrenalina, com efeitos mensuráveis no stress, ansiedade e humor.
Para ser claro: não é a motocicleta que cura, mas o projeto educativo e terapêutico construído em torno dela. Tal como acontece com a musicoterapia ou a terapia com animais de estimação, é a integração clínica que transforma uma ferramenta num veículo para a saúde.
Negar a dignidade terapêutica da terapia motora é uma forma de resistência cultural que corre o risco de excluir pessoas de experiências que poderiam melhorar significativamente a sua qualidade de vida. A medicina moderna – agora mais do que nunca – depende da capacidade de integrar, ouvir e observar o que realmente promove o bem-estar.