Encerrámos 2024 com uma cara bem conhecida do motociclismo: Manuel Marinheiro. A dirigir há quase 12 anos os destinos da Federação do Motociclismo de Portugal (FMP) tem feito um trabalho exemplar e que está a dar muitos fruto, além de que dá também um forte apoio ao escolhido para a crónica desta semana. Aliás, são vários os portugueses que estão diretamente envolvidos nos destinos Federação Mundial do Motociclismo (FIM), estando ou não fisicamente na Suíça.
Assim, para começar 2025 também da melhor forma, vamos buscar outro nome sobejamente conhecido, talvez até mais fora de portas que em Portugal, mas já lá vamos: a escolha da semana será Jorge Viegas ele que, atualmente é o Presidente da FIM e esteve na génese da criação da FMP, tendo sido o seu líder durante vários anos.
Jorge Pessanha Viegas ou mais simplesmente Jorge Viegas, tal como José Amaro, também é algarvio de gema! Ambos nasceram em Faro e até a diferença de idades é pouco significativa, sendo que Amaro nasceu em 1954 e Viegas em 1956. A grande diferença é que Viegas deixou cedo o Algarve e veio para Lisboa, tornando-se depois um cidadão do mundo e Amaro tornou-se também cidadão do mundo, mas sem nunca sair do seu Algarve!
Veja também Manuel Marinheiro: advogado, dirigente associativo, pai e motociclista
Como tudo começou
Viegas nasceu a 9 de dezembro de 1956 em Faro e ainda há menos de um mês completou 68 anos. Ou seja, já tem idade para estar reformado, mas continua, agora a meio do segundo mandato, a ser o homem do leme na FIM e não dá sinais de abrandar, muito pelo contrário.
Não se pense que é um leme fácil. Basta pensar que são dezenas de federações, de diferentes modalidades, parcerias estratégias, organizações com que lidar e todas espalhadas pelo mundo fora. Foi o próprio a assumir que num ano que tem 52 semanas… Jorge acaba por passar cerca de 40 delas fora de casa, com intermináveis viagens de avião, dezenas de aeroportos, reuniões com muita gente, participação em eventos… não é para qualquer um, de maneira alguma!
Na perspetiva mais idealista e sonhadora até deve ser giro, mas acaba por ser um verdadeiro pesadelo andar sempre com a casa às costas de um lado para o outro e quase não ter vida pessoal ou tempo para a família, os amigos ou os hobbies…
Veio ainda bastante cedo para Lisboa, formou-se em Economia no ISE, mas as motos, que muito cedo entraram na sua vida, acabaram por lhe trocar as voltas! Em vez de análise de dados estatísticos, cenários macro ou microeconómico, analisar o comportamento dos mercados e das economias, prever tendências e por aí adiante… foram as motos e tudo o que com elas se relaciona que lhe moldaram o futuro, mas já lá vamos.
Aliás, a sua vida profissional ainda começou, de forma algo visionária, como gerente na RP Global em Portugal (Energias Renováveis), mas foi sol de pouca dura. O seu futuro estava e continua a estar no mundo das motos. O motociclismo é a sua vida.
Provavelmente nunca imaginou ser o primeiro português a estar à frente de um tão prestigiado organismo, verdadeiro topo da hierarquia do motociclismo mundial, mas foi o que aconteceu em 2018 em que sucedeu a Vito Ippolito, que tinha completado três mandatos. Já vai no segundo mandato, sendo o líder da equipa que agora até tem casa nova em Mies, bem próximo de Genebra.
E as motos?
O jovem Jorge começou a interessar-se verdadeiramente pela competição muito cedo e logo por uma modalidade muito exigente e completa como o motocross, ali por alturas de 1974, mas acabou por perceber que o seu principal interesse estava na velocidade e para a mudança foi um pulo.
Muitos dos menos jovens ainda se lembram do ver correr, talvez mesmo ao seu lado no Estoril ou em Vila Real, mas não foi apenas dentro de fronteiras o seu percurso já que correu também fora de Portugal, por exemplo, em alguns GP’s de 250cc e nas célebres 24 Horas de Le Mans.
Ou seja, a FIM não podia ter melhor presidente e logo o 13.º! Um português, que é sempre desenrascado, fala sempre várias línguas, tem um sorriso rasgado, anda bem-disposto e não tem medo da mudança… e se sabe muito de motos… é a conjugação perfeita! Os 99% de votos para o seu segundo mandato falam por si! Um feito notável!
Além de piloto esteve também ligado ao jornalismo das motos e foi ganhando conhecimentos e contatos pelo mundo fora, além de ser um dos fundadores da FNM/FMP e o seu primeiro presidente, corria o ano de 1990. Chegou também a ser Presidente do Circuito do Estoril depois de nomeado pelo governo de Portugal, ele que lá correra antes inúmeras vezes! Ainda dizem que não há coincidências!
Como se não bastasse, ainda foi também Juíz/Árbitro do Tribunal Arbitral do Desporto, reforçando sempre que os atletas que praticam desportos motorizados (velocidade, enduro, motocross, trial, rally, resistência ou qualquer outra modalidade) são também muito importantes na promoção destas modalidades e parte do mérito de termos tido dois campeões mundiais de todo o terreno, Hélder Rodrigues e Paulo Gonçalves, também lhe pertence!
Já a sua ligação à elite do motociclismo mundial, via FIM, começou ainda no início da década de 90, sendo que em 1992 já era membro da direção da FIM e foi desempenhando uma série de cargos até, em 2018 e depois de uma série de episódios mais ou menos palacianos chegar à liderança daquele organismo que tem conhecido, sob a sua liderança, um renovado ímpeto.
Ninguém é profeta na sua terra
Esta expressão, retirada da Bíblia e propósito de um episódio em que Jesus é mal recebido e ignorado na sua terra, aplica-se perfeitamente a Jorge Viegas e vem mostrar algo que o próprio já afirmou mais que uma vez: onde é menos conhecido e apreciado acaba por ser no seu próprio país!
É um facto que em 2019, durante a festa de Gala dos Campeões da FMP, realizada no Salão Preto e Prata no Casino do Estoril, recebeu das mãos do Secretário de Estado da Juventude e Desporto, João Paulo Rebelo, um importante reconhecimento peço seu trabalho. Nada menos que a Medalha de Honra de Mérito Desportivo.
Porém, se quiserem, façam um pequeno exercício e perguntem a muitos motociclistas quem é Jorge Viegas e vão ficar surpreendidos (eu fiz o exercício e fiquei triste com o resultado). Continuamos a ser um país em que apesar de todas as mudanças ainda vivemos muito na linha dos três F’s, em especial o terceiro: Fado, Fátima e Futebol!
Parece que muita gente, nomeadamente motociclistas, ignora que Jorge Viegas nunca esqueceu Portugal e, por exemplo, boa parte do mérito do MotoGP ter voltado ao nosso país depois de uma longa ausência tem o seu cunho e empenho pessoal.
E daqui para a frente, o que vai fazer Jorge Viegas? Naturalmente que o seu objetivo é completar o segundo mandato que vai sensivelmente a meio, mas e depois? Terá força anímica para um terceiro mandato? Vai, pelo contrário, dar a si próprio algum descanso e reduzir a sua intensa atividade profissional?
Será uma decisão complexa e que, certamente, vai também envolver a família e pessoas mais próximas, mas qualquer que ela seja, Jorge Viegas já conquistou o seu lugar na história do motociclismo e é, com toda a legitimidade, uma personalidade que representa o que de melhor há nos portugueses.
O vídeo que se reproduz abaixo mostra um pouco do caráter deste nosso compatriota, com bónus de conduzir a Kawasaki que tinha usado em Le Mans no longínquo ano de 1978: