O final de 2023 está cada vez mais próximo. No no que diz respeito ao Imposto Único de Circulação (IUC) que para os veículos da Categoria E (Motociclos, Triciclos e Quadriciclos) com cilindrada igual ou superior a 120 cc e matrícula de 1992 em diante, tudo aponta agora para fique tudo na mesma.
Já sobre as IPO (Inspeções Periódicas Obrigatórias), o Decreto-Lei n.º 29/2023, de 5 de maio, emitido pela Presidência do Conselho de Ministros, deu um passo decisivo para que se tornem uma realidade, a partir do início do próximo ano e em todos os motociclos, triciclos e quadriciclos com cilindrada superior a 125 cc, sendo que a comunidade motociclística se tem manifestado contra por diversas vezes.
Porém, ainda falta legislação complementar que defina algumas das regras e procedimentos para a implementação efetiva das mesmas, já a partir de 1 de janeiro de 2024, como prevê o ponto 2 do Artigo 18.º daquele Diploma.
Apresentamos um conjunto de cinco argumentos favoráveis às IPO. Numa lógica de contraditório, para reflexão mais abrangente, apresentamos também cinco argumentos contra.
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Cinco argumentos a favor das IPO
1 – As IPO vão melhorar a segurança destes veículos. Este tem sido o principal argumento a favor das inspeções e é o que está subjacente à Diretiva 2014/45/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de abril de 2014.
O raciocínio, perfeitamente legítimo, é que, tal como nos veículos de outras categorias, as inspeções possam detetar muitas situações não conformes, parte delas até desconhecidas dos seus proprietários. Tomando por exemplo os Açores ou a vizinha Espanha, onde as IPO já se realizam há vários anos, esta justificação acaba por fazer sentido.
2 – AS IPO podem reduzir a sinistralidade. Esta argumentação vem em linha de continuidade com a anterior. Ou seja, se os veículos forem mais seguros (ao nível do estado dos pneus, suspensões, iluminação, travões) e sem anomalias, então é previsível que ocorram menos sinistros.
Não vale a pena ignorar o óbvio, os veículos da Categoria E, nomeadamente os motociclos, apresentam índices de sinistralidade mais elevada que os outros veículos e tudo o que puder ser feito para a redução da mesma é uma mais-valia. Salvar vidas é essencial, sejam ou não dos motociclistas.
3 – Muitas situações de ilegalidade vão deixar de ocorrer. Infelizmente teimam em continuar a existir situações de quadros trocados, quilómetros adulterados, alterações estruturais não reversíveis nas motos, entre outros.
Com as IPO algumas destas situações poderão ser detetadas e diminuir a criminalidade nesta área. Além disso, a folha da IPO vai constituir-se como um argumento positivo de venda do veículo e é previsível que as seguradoras venham também a exigir a referida folha. A questão dos quilómetros é particularmente efetiva e “martelar” quilómetros pode deixar de fazer sentido.
4 – O meio ambiente vai sair beneficiado. Pode parecer pouco relevante, mas não é. Um veículo melhor afinado, nomeadamente nos veículos a carburador, com um filtro de ar novo e um escape homologado consegue ser menos poluente e ruidoso.
Existem demasiadas situações em que, por opção, por desmazelo, falta de condições económicas ou qualquer outro motivo os motociclos libertam demasiadas emissões, produzem muito ruído ou têm fugas de combustível ou óleo, isto apenas para dar alguns exemplos.
5 – Os veículos vão ser valorizados. Naturalmente que depende muito da forma como forem feitas as IPO, mas situações de chapa podre, pintura ou cromados em péssimo estado, pneus velhos, assento roto, alterações duvidosas na iluminação podem vir a ser corrigidas ou pelo menos mitigadas.
Ninguém está à espera que as IPO mudem por completo a realidade dos veículos da Categoria E, mas há muito a fazer nesta matéria e é expetável que alguns dos veículos que vemos por aí acabem por ser recuperados ou mesmo abatidos, tornando-se veículos dadores ou peças de arte.
Cinco argumentos contra as IPO
1 – Trata-se de um negócio. Este é um argumento de peso e somado às alterações de IUC que estão neste momento em suspenso, pode fazer mossa em algumas carteiras, nomeadamente em quem tem várias motos e que, muitas vezes, pouco anda com elas, mas que agora não se livram de ir à IPO e representar mais um custo para o dono.
Existindo ou não lobby, não há como negar a componente mercantilista das IPO. Beneficia o Estado que recebe mais impostos, os Centros que faturam mais e as oficinas/mecânicos/empresas do ramo que acabam por ter mais trabalho e, consequentemente, receita.
2 Podem matar as motos customizadas. Esta é uma questão fraturante e representa um importante mercado, não apenas no nosso país, mas um pouco por todo o mundo. Muitas alterações são praticamente irreversíveis e mesmo que melhorem a segurança dos veículos, por exemplo o sistema de travagem, podem ser “chumbadas” por causa disso.
É difícil de perceber como é que em Portugal ainda não existe legislação específica sobre esta matéria, seja para os veículos desta ou de outras categorias. Está aqui uma forma de disciplinar esta prática e com bom senso e alguma regulamentação todos podiam ficar a beneficiar.
3 – Vão continuar a existir situações fraudulentas. Mesmo com sistemas de vigilância as situações de ilegalidade não vão acabar. Certamente que já ouvimos falar da nota junto ao cinzeiro ou de viaturas que receberam a folha verde da IPO sem sequer ir ao centro.
Acresce que, em muitos casos, depois da IPO é fácil, por exemplo, voltar a colocar um escape mais ruidoso que o limite legal, retirar os retrovisores ou usar uns pneus diferentes. Naturalmente que aqui é fundamental existir mais controlo por parte das autoridades, mas deve ser antecedido de alguma formação. Afinal de contas, a realidade dos veículos da categoria E distingue-se de todas as outras.
4 – As IPO vão ter pouco reflexo sobre a sinistralidade. Há diversos estudos que reforçam esta afirmação. Além disso, a prática mostra que boa parte dos donos destes veículos são muito mais cuidadosos com eles que, por exemplo, com os seus automóveis. Assim, a possibilidade de falha mecânica é mínima.
Em linha de consonância, há quem sugira que este dinheiro das IPO era melhor investido em ações de formação e sensibilização obrigatória. Este tipo de atividades poderia ter um efeito muito mais benéfico sobre a sinistralidade, mais ainda se fosse aplicado logo a partir dos 14 anos, ano em que se pode obter a categoria AM ou mesmo mais cedo, logo no primeiro ciclo.
5 – A existirem, deveriam ser para todos os veículos. A manter-se a proposta atual, escapam às IPO uma importante fatia dos veículos de duas ou mais rodas que circularam em Portugal. Basta pensar em todos os ciclomotores e motociclos da categoria inferior a 125 cc.
Sendo ou não uma diretiva comunitária que está por detrás (a versão nacional inicial previa a partir de 250 cc), o facto é que não faz sentido deixar de parte milhares de veículos sem fazer a IPO podendo, dessa forma, ficar no estado em que se encontram. Mais relevante ainda, se o argumento é a segurança, muitos acidentes envolvem veículos até 125 cc, nomeadamente ciclomotores.