A Yamaha RD 350 LC (Road Developed ou será mais Race Developed?) representou um marco importante no mercado das motos a dois tempos que eram, ao mesmo tempo, dotadas de uma excelente performance e de custos de aquisição mais reduzidos face às caras motos a quatro tempos da época, com o dobro ou mais de cilindrada, para valores de potência equiparados.

POR: Pedro Pereira
Fotos: Paulo Calisto
A primeira RD 350 chegou ao mercado em 1973 e tinha performances assombrosas, mas a ciclística, nomeadamente o deficitário sistema de travagem, tinha dificuldade em lidar com tanta potência. Associado a este facto está a inexperiência de muitos dos seus condutores e, claro, que tinha tudo para correr mal. Já o triste apelido de “Viuva Negra” manteve-se mesmo nas gerações seguintes, ainda que de forma injusta, porque a moto foi sendo bastante melhorada a todos os níveis, nomeadamente a travagem.

Uma história única
A Yamaha conseguiu afirmar-se no mercado global dos motociclos em poucas décadas e, durante vários anos, a sua aposta foi nos motores a dois tempos, onde tinha mais experiência e conseguia colocar no mercado produtos com um preço mais baixo, mas com elevadas performances.

Quando chegou ao mercado em 1973, o sucesso da RD foi imediato! O novo modelo da marca dos diapasões, herdeira das DS7 e R5, tinha tudo para conquistar o mercado: elevadas prestações do seu motor, estética jovem e numa diversidade de cilindradas ao longo dos anos: 90 cc, 135 cc, 200 cc, 250 cc e 350 cc, 400 cc e até 500 cc, mas vamos focar a nossa análise apenas na 350 cc que representava um ponto intermédio na hierarquia, foi comercializada entre nós e é, na atualidade, uma moto de culto.
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Debitava cerca de 39 cv de potência às 7500 rpm e um binário de 40 Nm às 7000 rpm para um peso em ordem de marcha inferior a 150 kg, o que fazia dela quase uma moto de corridas. Tinha apenas um travão de disco à frente, tambor atrás, dois amortecedores traseiros, refrigerada a ar e não dispunha de válvula de escape. Até às 5000 rpm quase não havia motor e daí para a frente tornava-se num foguete difícil de parar!

A Versão LC (Liquid Cooled) surgiu em 1980 e só algum tempo depois passou a ser equipada com duas válvulas de escape (YPVS – Yamaha Power Valve System) que lhe mudaram quase por completo o comportamento. A ideia, genial, era bastante simples: duas pequenas borboletas, colocadas cada uma nas janelas de saída do cilindro. Estavam quase fechadas a baixa rotação e iam abrindo gradualmente até que, por volta das 5000 rpm abriam por completo, deixando sair os gases sem restrições. Conseguia-se assim uma resposta mais agradável em baixas rotações, sem nunca abdicar da tradicional potência nos regimes mais altos.

A pressão ambiental começou a ser mais alta e a marca percebeu que os motores a dois tempos começavam a ser menos populares. Ainda que sujeitando o modelo a novas atualizações e melhorias ficou claro que o seu destino estava traçado, mesmo que o motor tenha tido outras utilizações, nomeadamente na popular Banshee (uma moto 4 muito especial).

Prioridade à Performance
Uma Yamaha RD 350 LC era e continua a ser, desde que devidamente afinada e mantida, uma moto em que as prestações do seu motor são o principal motivo de destaque e não é à toa que vários dos seus blocos acabam por ter outras utilizações.
São comuns as suas utilizações na Banshee (segundo a cultura celta, é uma fada maquiavélica) com a mais-valia de estar equipada com YPVS, que a Moto 4 não tinha, e até em outras motos com ciclística mais atual, caso da Cagiva Mito, sobre a qual falaremos numa próxima crónica.

Se é um facto que até chegarmos às 5000 rotações os valores de potência e binário são perfeitamente normais, começa aí a mutação e o motor transfigura-se, tal como a melodia dos escapes e a potência consegue chegar a uns estonteantes 59 cv às 9000 rpm (daí para a frente começa a cair abruptamente) e o binário é de 46,5 Nm às 8500 rpm. Tudo isto num motor de dois cilindros com apenas 347 cc e um peso em ordem de marcha a rondar os 160 kg!

Sensações de condução
Um agradecimento público ao Elias Alves, feliz proprietário desta fantástica RD 350 LC de 1983, neste caso concreto uma versão semi-carenada (K31) que veio importada da Alemanha, para dar mais colorido e alegria ao parque de motociclos nacionais.
Conseguir esta moto, que agora está num estado quase de concurso, foi para ele a concretização de um sonho antigo e para mim, que nunca a tinha conduzido, a oportunidade de perceber que mesmo com todas as suas limitações, andar nesta RD é a garantia de muitos sorrisos, de orelha a orelha.
A estética é soberba, as linhas são desportivas sem exageros e a posição de condução bastante neutra, sem que nos sintamos forçados a fazer uma curvatura das costas exagerada. Talvez seja mesmo mais “Road Developed” e menos “Racing”, o que só abona a seu favor.
Muito fácil de colocar em funcionamento (motor a dois tempos) tem uma idiossincrasia típica da engenharia da década de 70’: antes de acionar o “kick” com a bota direita convém recolher o pousa-pés porque fica exatamente no caminho e embater nele pode ser doloroso. Já agora, depois do motor em funcionamento, importa colocar o pousa-pés na sua posição e, se possível, antes de arrancar para evitar malabarismos com a perna direita, como sucedeu comigo.
Esta peça de relojoaria japonesa, apesar da baixa quilometragem indicada, menos de 10 000 km, já foi alvo de um carinho mecânico tendo levado o “kit” de pistões para lhe devolver a forma original e os equídeos estão lá todos, sendo que se tornam omnipresentes a partir das 6000 rpm e preguiçosos a partir das 9000 rpm, altura em que as velocidades são já proibitivas e a vibração notória. Aliás, ver a agulha no taquímetro, colocado em posição central, disparar entre as 6000 e as 9000 rpm é inebriante.
É uma modificação comum a troca dos discos perfurados com formato de ranhura por uns perfurados simples, seja porque os originais são frágeis, seja porque são bastante caros e difíceis de encontrar, mas o facto é que a travagem cumpre, desde que não se adote uma condução mais viva. Aí até o quadro e as suspensões começam a mostrar as suas limitações, tal como os anoréticos pneumáticos: apenas 90/90-18” à frente e 110/80-18” atrás.
Ainda uma modificação comum é retirar o “miolo” dos escapes, ajudando a que o motor respire melhor, sobretudo nos regimes mais elevados. O problema é que o ruído acaba por se tornar mais forte e os consumos em nada são beneficiados. De qualquer modo, abordar a questão dos consumos (óleo e gasolina) é nesta moto algo de importância relativa e já sabemos que usando tudo o que o motor tem para dar os 20 litros do depósito não chegam para 200 km!
Notas finais
Apesar do problema crónico das emissões dos motores a dois tempos, não há como negar que estão na moda e a atingir valores de transação incríveis, mas não é difícil de perceber porquê, mais ainda depois de testar esta RD 350 LC e ficar completamente rendido à performance do seu motor.
Todos sabemos que uma moto não é só o motor e abundam os exemplos em que o principal destaque não vai para a unidade motriz, mas nesta pujante RD 350 LC o relevo vai mesmo para o vigoroso bicilíndrico. O Elias que me desculpe, mas a vontade de vir nela para casa foi imensa!
Yamaha RD 350 LC
Pontuação:
Estética | 4 |
Prestações | 4,5 |
Comportamento | 3,5 |
Suspensões | 3,5 |
Travões | 3,5 |
Consumo | 3 |
Ficha técnica:
Motor | Bicilíndrico a dois tempos, refrigeração líquida |
Distribuição | Gasolina com mistura (autolube) e duas válvulas de escape (YPVS) |
Cilindrada | 347 cc |
Potência | 59 Cv às 9000 rpm |
Binário | 46,5 Nm às 8500 rpm |
Embraiagem | Manual, acionada por cabo |
Final | Corrente |
Caixa | 6 velocidades |
Arranque | Pedal |
Quadro | Duplo berço, em aço |
Suspensão dianteira | Forquilha telescópica convencional, curso 140 mm |
Suspensão traseira | Mono amortecedor, com 100 mm de curso |
Travão dianteiro | Dois discos de 267 mm, pistão simples |
Travão traseiro | Disco de 267 mm, único pistão |
Pneu dianteiro | 90/90-18 |
Pneu traseiro | 110/80-18 |
Comprimento total | 2120 mm |
Largura total | 710 mm |
Altura total | 1175 mm |
Distância entre eixos | 1385 mm |
Altura do assento | 800 mm |
Peso | 164 kg (a cheio) |
Depósito | 20 litros |
Cores | Variáveis ao longo da sua produção (1980-1994) |
Preço | – |
Importador | Yamaha |