Por toda a sua história, a Honda é uma das marcas mais ricas no que a modelos históricos diz respeito. Prova disso é a Honda CBX 1000 Super Sport, responsável por uma nova página na história das duas rodas.Mais uma moto especial, portanto!
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Por: Pedro Pereira
Fotos: Paulo Calisto
Ainda na década de ’60 a Honda, no seu processo de afirmação global, usara motores de seis cilindros em competição (caso da RC166 250-6), mas foi a popular Honda 750 CB Four (quatro cilindros) que mudou o mundo no ano de 1969.
Ainda assim, a ideia de produzir, para comercialização junto do grande público, motores de seis cilindros não foi esquecida, sobretudo depois da concorrente Kawasaki lançar a sua poderosa Z1 900 (testada na edição #100) e os outros construtores japoneses, Yamaha e Suzuki, se prepararem para novos lançamentos cada vez mais ambiciosos.
Foi então que no quartel-general da marca, decidiram que fazia sentido lançar uma superbike de seis cilindros. Algo nunca visto numa moto de produção, não considerando a exótica Benelli 750 Sei que, mais tarde, surgiu também como 900 Sei, fruto da genialidade de Alejandro De Tomaso.
A novíssima CBX 1000, que tinha o nome de código “Projeto 422”, era o fruto do talento da equipa liderada por Shochiro Irimajiri e a moto foi muito bem aceite, nomeadamente pela comunicação social. As suas especificações impunham respeito: 1047 cc, seis cilindros, alimentados por seis carburadores, vinte e quatro válvulas, dupla árvore de cames e uma potência superior a 100 cavalos. A Honda estava novamente na linha da frente da inovação.
Durante o ano de 1978 começaram a chegar aos distribuidores europeus e, um pouco mais tarde, também aos Estados Unidos, sendo que a CBX era uma moto verdadeiramente impressionante, com um som verdadeiramente viciante, com escape do tipo “seis em dois”.
Curiosamente, as vendas acabaram por ficar um pouco aquém do esperado e nem mesmo o facto de alguns milhares de exemplares terem sido montados nos Estados Unidos (Ohio), resolvendo assim as questões das taxas de importação, lhe garantiram um futuro verdadeiramente promissor.
De tal forma que, em 1981, e marca optou por dar uma orientação mais touring à sua superbike, passando a vir equipada com carenagem, malas laterais e mono amortecedor traseiro (Sistema Pro Link), tudo no sentido de lhe reforçar a vocação turística, chegando ao ponto de “amansar” um pouco o motor, tornando-o mais utilizável nos baixos e médios regimes.
Curiosamente parte do sucesso abaixo do esperado em termos de vendas (foram produzidas cerca de 40 000 unidades), deve-se à própria Honda. Pode parecer paradoxal, mas quase ao mesmo tempo da CBX 1000 a marca desenvolveu e veio a comercializar a popular Honda CB 900F.
Chegou ao mercado em 1979 e apesar de ter “apenas” quatro cilindros era bastante mais acessível na aquisição e utilização, além de ser mais ágil e leve. Como se não bastasse, podia também ser usada diretamente na competição já que as suas especificações técnicas permitiam a sua integração nos regulamentos existentes. Escusado será dizer que, na atualidade, não goza, nem de perto nem de longe da valorização da CBX 1000, mas à época retirou-lhe muito protagonismo e vendas.
Não é um pássaro, nem um avião e nem mesmo o Super Homem!
Esta analogia à célebre personagem da banda desenhada criada por Joe Shuster e Jerry Siegel no já longínquo ano de 1938, dizia respeito à forma como o Super Homem aparecia a voar e deixava todos siderados.
A CBX não é uma moto voadora, mas quase parece e nem sequer é necessariamente pela sua performance elevada. Ao que consta, consegue ir além dos 200 km/h com facilidade, mas certamente só em circuito ou numa qualquer “autobahn”, além de que é algo que deve ser feito por conta e risco de quem a conduz: Um exemplar num excelente estado como este do Mário Sousa, a quem se agradece a disponibilidade, simpatia e conhecimentos, tem um valor de mercado que facilmente pode chegar aos 15 000€ e não será fácil de encontrar em terras lusas.
Os seis cilindros a frio acabam por ter um cantar desinspirado e triste, quase parecendo um motor descompensado e indigno dos pergaminhos e genialidade de Irimajiri. Tudo desaparece depois de fazermos alguns quilómetros, do motor entrar na sua temperatura normal de funcionamento e de podermos deixar os seis cilindros cantarem livremente pelos dois escapes.
Há quem compare a sonoridade a um caça a jato ou a um carro da Fórmula 1 dos anos oitenta. Direi que é uma espécie de um misto de ambos. Uma experiência que não se esquece, mais ainda porque nesta altura as restrições sonoras e de emissões estavam bem longe das que conhecemos hoje.
Experiência condução
A CBX acaba por ser uma moto que nos consegue intimidar à primeira vista, a que não é alheio o seu peso elevado, cerca de 270 kg a cheio, o sobredimensionamento de alguns dos seus componentes, com destaque para o avantajado motor, a volumosa traseira, os piscas gigantes ou o assento largo e confortável.
O ritual, mais que conhecido, é o de sempre: torneira de gasolina na posição aberta, enriquecer a mistura (choke) no guiador, do lado esquerdo e depois premir o botão do motor de arranque, podendo até ser necessário dar uma pequena ajuda com o acelerador.
Enquanto aguardamos um pouco antes de iniciar a marcha, temos oportunidade apreciar mais a moto. Todos os comandos fáceis de utilizar ou não fosse uma Honda, bons acabamentos, cuidados acrescidos na pintura (ainda é a original, com os seus cerca de 57 000 km) e corpo ligeiramente fletido para a frente, mas sem carregar demasiado nos pulsos.
Grande destaque para a agulha do taquímetro (zona proibida às 9500 rpm) e para a escala do conta-km que vai até aos 240 km. Várias luzes avisadoras e ainda um manómetro, gigante, para indicar o nível de carga da bateria. Outros tempos.
Finalmente fecho o ar e dou-me ao luxo de engrenar a primeira, com uma embraiagem pesada, mas de grande suavidade e começa a diversão, enquanto nos vamos familiarizando com os travões, do tipo “abrandadores” e das suspensões que tentam dar o seu melhor, mas têm notória dificuldade em lidar com o peso, a potência e o asfalto de qualidade duvidosa, sobretudo quando é preciso curvar.
Ao fim de poucos minutos parece que já nos conhecemos há muito tempo. Numa relação de respeito mútuo em que cada um sabe o seu papel e ambos querem desfrutar destes momentos mágicos de uma moto que tem hoje uma legião de admiradores e fãs, maior que nos tempos em que era comercializada. Depois deste teste eu tornei-me um deles, em boa medida pela peça de relojoaria que é o motor.
Notas finais
Este magnífico exemplar de 1981 veio da Alemanha há vários anos, nunca foi alvo de qualquer restauro e continua com um excelente aspeto, sendo capaz de fazer feliz qualquer um que tenha a oportunidade de estar aos seus comandos.
Claro que não é uma moto perfeita, que os consumos chegam com facilidade a valores de dois dígitos, que os carburadores são temperamentais e quando conduzimos temos de ter em conta que se trata de um projeto da década de 70, mas a sua nobreza mecânica faz-nos esquecer todas as suas limitações.
Bem que a Honda podia pensar em lançar uma moto com um motor destes, talvez até com um litro de cilindrada, caraterísticas aproximadas e engenharia atual. Desconfio que não iam faltar interessados!
Pontuação:
Estética 4
Prestações 4,5
Comportamento 3,5
Suspensões 3,5
Travões 3,5
Consumo 3,5
Ficha técnica:
Motor Seis cilindros em linha, refrigeração ar/óleo
Distribuição Dupla árvore de cames, 24 válvulas
Cilindrada 1047 cc
Potência 105 Cv às 9000 rpm
Binário 72 Nm às 6.500 rpm
Embraiagem Manual, acionada por cabo
Final Corrente
Caixa 5 velocidades
Arranque Elétrico
Quadro Tubular em aço
Suspensão dianteira Garfo telescópico ajustável a ar
Suspensão traseira Dois amortecedores ajustáveis
Travão dianteiro Dois discos de 276 mm
Travão traseiro Disco de 296 mm
Pneu dianteiro 3.50-V19
Pneu traseiro 4.25-V18
Comprimento total 2220 mm
Largura total 780 mm
Altura total 1145 mm
Distância entre eixos 1495 mm
Altura do assento 810 mm
Peso 272 Kg (a cheio)
Depósito 20 litros
Cores Variáveis ao longo da sua produção (1978-1982)
Importador Honda
Equipamento Usado:
Capacete: Schuberth
Casaco: Merlin
Luvas: RSW
Calças: Alpinestars
Botas: TCX