Apresentada há mais de dois anos em Milão como um concept revivalista, as reações foram de tal forma positivas que a fábrica de Hamamatsu decidiu avançar para a produção. Viemos po-la à prova…
Por Rui Marto Fotos Rui Jorge / Suzuki
A tendência “retro” está viva e bem de saúde, com a maioria dos grandes fabricantes a colocar no mercado algum modelo que pisca o olho ao passado, a maioria também com bastante sucesso nos seus modelos revivalistas. A Suzuki não quis ficar para trás, e pegou num dos seus modelos mais icónicos do passado, e reinterpretou-a aos dias de hoje. A nova Katana é uma clara homenagem ao modelo originalmente lançado em 1982, com muitos detalhes no seu design a invocar claramente a moto dos anos oitenta, tal como o farol retangular na frente e o formato das carenagens dianteiras, com os seu ângulos bastante marcados e agressivos, mas também com novas nuances que deixam claro que esta moto não se trata exclusivamente de um “remake”. No entanto, e tal como a original, a soma de todos os detalhes confere-lhe a mesma atitude descomprometida, com uma silhueta muito particular e detalhes únicos, o seu aspecto está longe de ser consensual mas uma coisa é certa – não deixará ninguém indiferente.
Corpo de atleta
Estamos em 2020, e hoje o aspeto não basta – é necessário suplementar a aparência com boas doses de substância, conteúdo. A Suzuki não foi indiferente a este princípio, e dotou a nova Katana com elementos dinâmicos com argumentos capazes de fazer inveja a motos em teoria mais capazes. O motor é mesmo que equipou a GSX-R1000 entre 2005 e 2008, reajustado a este estilo de moto, ou seja, capaz de entregar melhores prestações nos baixos e médios regimes, e capaz de cumprir com as normas de emissões atuais, conseguindo ainda assim debitar 150 cv e 108 Nm de binário máximo. O quadro é inspirado também na GSX-.R1000, mas neste caso no modelo de 2016, assim como o braço-oscilante que é exatamente igual. As suspensões foram colocadas a cargo das unidades KYB multi-ajustáveis tanto na dianteira como na traseira, e os travões a serem fornecidos pela Brembo. O peso do conjunto completo é de 215Kg em ordem de marcha, o que não a torna propriamente anorética, no entanto só se dá conta do peso quando está parada, uma vez em movimento acaba por disfarçar muito bem. Existem ainda sistemas de ajuda eletrónica, como o ABS e até controlo de tração multi-ajustável em 3 níveis, que pode ser completamente desligado.
Ao vivo
Chegados ao local da apresentação, somos brindados com uma agradável surpresa. A Suzuki trouxe para além do novo modelo, também uma Katana original, que acentuou ainda mais as semelhanças e diferenças entre o novo e o antigo modelo, deixando-nos apreciar ao vivo e a cores no que se traduzem 37 anos de evolução.
Temos presentes duas cores (as únicas disponíveis por agora), uma moto toda preta e uma cinza e preta, na minha opinião subjetiva a cinza funciona bastante melhor, conseguindo criar um maior contraste que permite apreciar os muitos detalhes de que estas motos são feitas, com todos os ângulos e arestas a serem bastante mais pronunciados por comparação.
Subindo “a bordo”, a posição de condução é bastante direita, com um guiador não muito largo – o que na minha opinião acabou por ser um ponto menos positivo, mais sobre isso mais à frente – e em geral bastante confortável, capaz de nos colocar na posição de comandar esta moto com bastante autoridade. As estradas escolhidas pela Suzuki para a apresentação, nas imediações da Serra de Montejunto, caracterizadas maioritariamente por serem bastante estreitas, de relativa baixa velocidade e em alguns casos em mau estado deixaram a descoberto todos os pontos positivos e negativos do modelo.
Assim que arrancamos, é notória uma surpreendente estabilidade, digo surpreendente já que as dimensões algo minimalistas e a postura dariam a entender uma moto nervosa, algo que acabamos por não verificar, já que esta estabilidade vem a custo de alguma agilidade, e é aqui que o comentário feito anteriormente à largura do guiador acaba por fazer sentido, já que um guiador um pouco mais largo ajudaria à manobrabilidade geral, em particular ao esforço exercido na entrada de curva e mudanças de direção.
A experiência é dominada pelo carácter do motor, sempre bastante cheio e que permite escolher o tipo de condução, sendo possível rodar em 6ª velocidade quase “parado”, assim como usar o motor até ao redline numa condução “hooligan”. A resposta ao acelerador é contundente, ainda que sofra de algum excesso de agressividade no toque inicial, que acaba por ser bastante notório em curvas longas onde seja necessário manter um acelerador com uma abertura de percentualmente pequena. O tipo de estrada por onde passámos acabou por minimizar este problema, e a condução “espevitada” ainda mais. A posição de condução elevada confere um bom controlo e deixa-nos brincar bastante, com o controlo de tração desligado acaba por ser relativamente fácil sair de curva em powerslide, já que a frente apenas fica leve mas não levanta se não for 100% provocada. Toda esta capacidade para acelerar está bem balanceada com uns travões potentes quanto baste, com uma “mordida” bastante progressiva, e que em nenhum momento me deixou com a sensação de falta de poder de travagem. É bastante fácil modelar a travagem até já bem dentro da curva com ângulos de inclinação respeitáveis. As suspensões não comprometem, ainda que o comportamento pudesse ser melhorado. A frente dá bastante confiança, mas a traseira é algo “saltitona”, especialmente em estradas em mau estado. Ainda assim, tanto a suspensão frontal como traseira são ajustáveis, o que permitirá corrigir até certo ponto esses problemas.
No geral, esta nova Katana é bastante “afiada” ainda que pudesse beneficiar de um pouco mais de polimento em algumas áreas.
Identidade clara
A nova Katana sabe o que é, e fá-lo orgulhosamente. Se estão à procura de uma moto de turismo, procurem noutro lado. Se estão à procura de uma mota prática, procurem noutro lado. Se estão à procura de uma moto para fazer muitos quilómetros de seguida, procurem noutro lado. Se estão à procura de uma mota para as saídas aceleradas pelas estradas secundárias ao fim de semana, vieram ao sítio certo! Ainda que o condutor vá extremamente confortável, não é uma moto pensada para passageiro, já que nem pegas existem. Da mesma forma, não será possível montar malas rígidas e converte-la numa “tourer”, ideia essa que fica logo descartada também pela dimensão do depósito, de apenas 12 litros, que acaba por negar qualquer hipótese de fazer tiradas maiores sem andar a fazer “turismo de estação de serviço”. Também a total ausência de protecção aerodinâmica, natural de uma naked deste estilo compromete esse tipo de utilização. Sentimos também a falta de um quickshifter, equipamento já quase “obrigatório” em todos os modelos novos, especialmente nesta gama de modelo.